BiblioGazeta on-line

terça-feira, agosto 14, 2007

O PROGRAMA DE VIDA DOS SALMÕES

Se há animal pelo qual tenho um fascínio particular, esse animal é o salmão. Por mil e mil razões. Mas a que agora mais interessa é o seu programa de vida. Aliás, um programa de vida muito, muito interessante embora um tanto ou quanto trágico. Vejamos porquê. Depois de passarem uma vida de quatro anos nos oceanos, os salmões adultos e anafados iniciam uma viagem de regresso ao lugar do rio onde nasceram. Movidos pelo dever de cumprir o seu programa, estas criaturas percorrem os quilómetros que forem necessários. Com a força de mover montanhas, sobem o rio lutando arduamente contra as águas que descem. A sua obsessão quase estóica pelo regresso, torna-os indiferentes às armadilhas do percurso (ursos pardos, aves, tubarões e outros peixes). Cansados e exaustos (e talvez tristes, ou não) chegam finalmente ao que foi o princípio que é agora o fim. Aí sofrem uma transformação absolutamente impressionante. Primeiro mudam a cor para vermelho vivo e verde. Depois, durante alguns dias, é todo um festival de cortejo de acasalamento para finalmente culminar na postura de milhões de ovos. E depois, pronto. Morrem. Assim sem mais nem menos. Tudo por um regresso. Mesmo depois de morrerem. É que as suas carcaças fazem uma última viagem através dos rios que as levam, pela última vez, de regresso aos oceanos. É trágico. Mas é talvez por isso que os admiro.

(Na Gazeta Animal de Julho/Agosto de 2007)

Etiquetas:

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

UM REINO POR UM CAVALO

Não é uma lamentação masculina mas que diabo, porque será que a maioria dos animais machos tem de produzir tantos milhares de espermatozóides? E porque há por aí uns animalecos privilegiados? É claro que nem tudo o que parece é. Quer dizer, a lógica da vida tem mesmo lógica mesmo quando por vezes ela é contra-intuitiva. Deixando para outra núpcias os tais privilegiados (como por exemplo a mosca da fruta que só produz um único espermatozóide) vejamos então o que leva os machos a produzir tantos espermatozóides.

A história é simples. Em espécies promíscuas em que uma fêmea copula com vários machos, a estratégia reprodutiva já não se prende com questões de beleza ou de força mas sim com os melhores espermatozóides. E os melhores são precisamente aqueles que ganham a guerra. E que guerra é esta? Na verdade, hoje sabemos que uns nadam mais depressa que outros, uns ligam-se mais eficazmente à membrana do óvulo do que outros, uns sacrificam a sua própria vida em detrimento do sucesso de outros. Esta teoria surgiu inicialmente para explicar a promiscuidade no acasalamento de algumas espécies de insectos. É que a maioria das fêmeas deste grupo copulam com vários parceiros e, depois, ou ejectam o esperma ou guardam-no dentro do seu corpo durante dias ou meses. Isto faz com que esse reservatório se torne num autêntico campo de batalha entre os espermatozóides dos vários machos. Os próprios humanos não ficam excluídos desta guerra pois a biologia explica-nos que o tamanho dos pénis dos humanos pode estar relacionado com uma forma diferente de selecção sexual, isto é, pénis maiores dão aos espermatozóides algum avanço inicial na altura da ejaculação. Por outro lado, os chimpanzés machos têm grandes testículos e grandes pénis em relação ao tamanho do seu corpo e pensa-se que exibam estas características pelo facto de, na época de acasalamento, a fêmea copular com o macho líder mas depois ter umas escapadelas, se é que me entendem. Portanto, na lógica da vida é assim: «um reino por um cavalo».

Etiquetas: ,

domingo, janeiro 28, 2007

AS PULGAS SÃO TÃO MAZINHAS!

A pulga é um parasita com quem frequentemente travamos intensas lutas para as erradicar. Para quem tem cães e gatos, é praticamente impossível fugir a essa batalha que todos os anos levam os veterinários a recomendar produtos e mais produtos com a promessa de serem cada vez mais eficazes. Sendo um parasita, vive à custa do hospedeiro sugando o seu sangue para que possa cumprir o ciclo para o qual foi programado. Digamos que faz a sua vida. E ao mesmo tempo que o faz transmite doenças. Já para não falar nos pobres coitados que sofrem de alergias à picada da pulga e que desesperam quando a sua pele é rompida por uma boca microscópica em busca de sangue. Por tudo isto convencionou-se que as pulgas são mazinhas.

Há uns tempos atrás, veio-me parar às mãos uma fábula de Leonardo da Vinci que dizia o seguinte: «Dormindo o cão na pele de um carneiro, uma das suas pulgas, sentindo o cheiro da lã gordurosa, julgou que este seria lugar de melhor vida e mais a salvo dos dentes e das unhas do cão do que continuar a alimentar-se do cão. E mantendo-se entre a felpuda lã, começou com extremo esforço a querer penetrar até às raízes dos pêlos; empresa que a cabo de muito suor verificou ser vã, porque esses pêlos eram tão espessos que quase se tocavam, e não havia espaço onde a pulga pudesse saborear a pele. Daí, após longo trabalho e fadiga, quis voltar ao seu cão; mas dado que este já se fora embora, viu-se obrigada, após longos arrependimentos e amargos prantos, a morrer de fome». Pois, pois. É o que acontece aos bichos mauzinhos e ambiciosos!

(Na Gazeta Animal de Janeiro de 2007)

Etiquetas: ,

quarta-feira, novembro 08, 2006

PORQUE É QUE O GANSO NÃO É OBESO?

Convenhamos. Nós não somos tão diferentes do resto do mundo que nos rodeia como isso. Sobretudo porque andamos todos ao mesmo. É porque o problema da sobrevivência é universal e comum. As respostas é que são diferentes. Sobreviver a uma altitude superior a 5 mil metros requer mecanismos de adaptação muito diferentes dos necessários para sobreviver no oceano. Guelras no ar não fazem sentido mas apenas tanto quanto não fazem sentido pulmões no oceano.

No seu mais recente livro, Eric P. Widmaier, professor de biologia da Universidade de Boston, chama-nos a atenção para o facto de como as estratégias evolutivas da sobrevivência afectam a nossa vida quotidiana. Em «Porque é que o ganso não é obeso (e nós aumentamos de peso)», editado em Portugal pela Gradiva, encontramos exemplos excelentes de como o meio ambiente nos desafia e de como, em grande parte, somos fruto da forma como respondemos a esse desafio. É que, embora à partida haja coisas que nos pareçam alhos e bugalhos, elas na verdade podem ter muito em comum. Por exemplo, as asas de morcego e as orelhas de elefante. Está bem que as asas servem para voar e as orelhas para ouvir mas ambas as estruturas desempenham um papel muito importante na manutenção da temperatura corporal. Precisamente por isso as orelhas dos elefantes africanos são maiores que as orelhas dos elefantes asiáticos. Vou contar-vos um segredo. É que na África faz muito mais calor. E depois há aquelas banalidades que observamos e que por momentos nos inquietam. Porque carga de água é que os animais mais pequenos, como os ratinhos, como o Speedy González, se movem energicamente e os maiores, como os elefantes, se movem pachorrentamente? O professor E. Widmaier explica-nos tudo tim-tim por tim-tim. É que os animais mais pequenos têm uma taxa de metabolismo muito superior à dos animais grandes, ou seja, gastam depressa aquilo que consomem. Por isso é que eles estão sempre a comer e não engordam. Como os gansos. Já os animais grandes, como o elefante, têm autênticos «acumuladores térmicos» (leia-se, massa corporal) que lhes permitem estar várias horas sem comer. Os morcegos e os musaranhos, por exemplo, ingerem até uma vez e meia o seu peso em comida por dia! Para um homem adulto como eu seria como comer cerca de mil cheeseburgers de 100 grama por dia, todos os dias da minha vida. Se assim fosse, raios partam a sobrevivência!
(Na Gazeta Animal de Novembro de 2006)

Etiquetas: ,

sexta-feira, outubro 27, 2006

CÃO, CÃO, QUEIJO, QUEIJO

Comecemos com uma banalidade. O cão é o nosso melhor amigo. O melhor e o mais fiel. Avancemos agora para um preconceito. A vida dos cães não passa de uma vida de cão. E terminemos agora com dois desejos. O que será que eles pensam de nós? E o que fazem eles quando não estamos em casa? Talvez estes três elementos – banalidade, preconceito e desejo – sejam comuns aos donos de cães (julgo eu mas não conheço a maior parte das pessoas). Na verdade, a vida dos nossos cães há muito que passou a ser a nossa vida. Como não somos nenhuns psicopatas, com facilidade emerge da nossa criatividade vidas de cão imaginárias recheadas de autocrítica e de boa disposição.
«Cão, cão, queijo, queijo» é a mais recente BD da colecção Café Cão criada por Paul Gilligan e editada em Portugal pela Gradiva. Nela se conta a história da vida de um cão, Poncho, que vive com os seus donos, Chazz e Carmen. E como qualquer vida, ela tem uma rotina muito bem definida. Poncho mostra-nos que os cães não têm apenas uma “vida de cão” assente na ligação homem-cão embora seja esse o nosso preconceito. Talvez por isso o Café Cão, um vulgaríssimo café para cães, seja o local predilecto para Poncho e os seus amigos de espécie desabafarem sobre os problemas e as incompreensões resultantes da vida entre humanos. Nele, além de assistirmos a uma catarse canina ao balcão devidamente acompanhada por uma boa cerveja, temos ainda o prazer de assistir a uma conspiração canina de catapultagem de todos os gatos para o sol. Para quem diz que aos cães só lhes falta é falar, este é um bom livro para se espantarem. É que se eles falassem, podia muito bem ser assim como Paul Gilligan nos conta. Porque, afinal, nem tudo é cão, cão, queijo, queijo.

(Na Gazeta Animal de Outubro de 2006)

Etiquetas: ,

quinta-feira, agosto 10, 2006

CONSULTÓRIO SEXUAL EM VÁRIAS LÍNGUAS (II)




ENTREVISTA

Leia aqui a entrevista da Dra.Tatiana à revista brasileira Galileu.

Um excerto para abrir o apetite:

GALILEU: Por que não existem tantos assexuados, homossexuais e hermafroditas na natureza como os simples 'machos e fêmeas'?

Dra. Tatiana: Assexuados e hermafroditas (seres ao mesmo tempo macho e fêmea) são na verdade muito comuns, apesar de nenhum ser encontrado entre mamíferos ou aves - entre vertebrados, os hermafroditas são encontrados apenas em algumas espécies de peixes. Os assexuados com freqüência evoluem; eles apenas não costumam persistir por muito tempo. Por outro lado, os hermafroditas podem às vezes se virar muito bem. E, novamente, muitos organismos são hermafroditas - a maioria dos caracóis e das lesmas, por exemplo, assim como muitas plantas - e alguns permanecem como tal por milhões e milhões de anos. Se nós fôssemos fazer uma lista de todas as criaturas do planeta, não sei se o número de representantes de machos e fêmeas seria maior do que o de hermafroditas. Já o homossexualismo é diferente. Para um geneticista, o homossexualismo é um tipo de esterilidade, pelo menos se esse comportamento é exclusivo, de forma que indivíduos homossexuais não tentam se reproduzir. E como o homossexualismo não leva à reprodução, os biólogos tendem a negligenciá-lo. Apesar de sabermos que muitas espécies de mamíferos assumem comportamentos homossexuais, nós não sabemos se esses indivíduos são na verdade bissexuais ou exclusivamente homossexuais.

(Todos os direitos reservados para a Editora Globo)

segunda-feira, julho 24, 2006

EM PORTUGUÊS...

O livro Dr. Tatiana's Sex Advice to All Creation de Olivia Judson foi traduzido (por Manuel Leite) para português pela Quetzal Editores. O título é uma tradução fidedigna - Consultório Sexual da Dra. Tatiana para Toda a Criação - e a capa é elegante embora pouco ousada na imaginação e na insinuação. Em português é assim:

CONSULTÓRIO SEXUAL EM VÁRIAS LÍNGUAS

É impressionante como falar de sexo entusiasma tanto os humanos! O mais recente livro de Olivia Judson conta já com 18 traduções. Uma diversidade de capas e de títulos estupenda.

QUEM É A DRA. TATIANA?

Na verdade, a Dra. Tatiana não passa de uma personagem criada nas profundezas da imaginação de Olivia Judson, uma bióloga evolucionista e jornalista científica e, agora, escritora. Judson recebeu o seu doutoramento em Ciências Biológicas pela prestigiada Universidade de Oxford, a mais antiga universidade do mundo anglófono, antes de se juntar ao staff da igualmente prestigiada revista The Economist. Mas a sua arte de divulgar depressa se alastrou a outras publicações, tendo também colaborado com o The New York Times, a "velha" Nature, The Guardian, The Financial Times, e o The Daily Telegraph. Como cientista, foi convidada a proferir palestras e seminários em Harvard, Stanford, na University of Lausanne, e na Royal Institution of Great Britain. Actualmente, é bolseira de investigação no Imperial College London. Consultório Sexual da Dra. Tatiana para Toda a Criação é o seu primeiro livro e o seu primeiro programa de televisão.